top of page
(07-a) Direito e Psicanálise 02-a
Deontologia.PNG
Dr. Arnaldo de Souza Ribeiro 1.PNG
logo transparente.png

Direito e Psicanálise 02-a

 

PROF.º DOUTOR ARNALDO DE SOUZA RIBEIRO
DIREITO E PSICANÁLISE
Rio de Janeiro

Escola Fluminense de Psicanálise Clínica
2005

Continuação do (07)/02

7 RACIONALIZAÇÃO

           É o processo pelo qual o indivíduo procura apresentar uma explicação coerente do ponto de vista lógico, ou aceitável do ponto de vista moral, para uma atitude, uma ação, uma ideia, um sentimento, cujos motivos verdadeiros ele não percebe. Fala-se mais especialmente da racionalização de um sintoma, de uma compulsão defensiva, de uma formação reativa.

8 NEGAÇÃO

           Processo pelo qual o indivíduo, embora formulando um dos seus desejos, pensamentos ou sentimentos, até aí recalcado, continua a defender-se dele negando que lhe pertence.

9 PROJEÇÃO

          Termo utilizado em sentido muito geral, em neurofisiologia e em psicologia, para designar a operação pela qual um fato neurológico ou psicológico é deslocado e localizado no exterior, quer passando do centro para a periferia, quer do sujeito para o objeto. Esse sentido compreende acepções bastante diferentes.
           No sentido propriamente psicanalítico, operação pela qual o sujeito expulsa de si e localiza no outro – pessoa ou coisa – qualidades, sentimentos, desejos e mesmo “objetos” que ele desconhece ou recusa nele. Trata-se, aqui, de uma defesa de origem muito arcaica, que vamos encontrar em ação particularmente na paranóia, mas também em modos de pensar “normais”, como a superstição.

          Notas:

          1. Cf. LAGACHE, Daniel. A psicanálise, p. 75-76.
          2. RAMOS, Chaia. Direito & psicanálises, p. 99.

                Capítulo VII – LEGISLAÇÃO E PARECERES PERTINENTES AO EXERCÍCIO PROFISSIONAL DA PSICANÁLISE

1 EXERCÍCIO DA PSICANÁLISE NO BRASIL E NO MUNDO

            A psicanálise não é regulamentada como profissão no Brasil e em nenhum outro país. Mesmo entre os psicanalistas e as diversas associações que os formam no Brasil e no mundo existem muitas controvérsias e discussões, embasadas no processo de formação e na natureza do exercício da prática terapêutica, sobre as possibilidades de sua regulamentação.

2 RECONHECIMENTO E REGULAMENTAÇÃO DA PSICANÁLISE

          Do latim recognitio, recognoscere (conferir, cotejar, inspecionar, examinar, achar de novo), o vocábulo reconhecimento empregado, na linguagem jurídica, em várias acepções, todas elas, em verdade, trazendo a afirmação ou a confirmação dos fatos reconhecidos.[1]
       É com base nesse conceito de reconhecimento, confirmado pelos usos e costumes nacionais e estrangeiros, que os psicanalistas vêm legitimamente exercendo suas funções, desde o inicio do século passado, quando da criação da psicanálise.
           O termo regulamentação, derivado de regulamentar (expedir regulamento, prescrever regras sobre forma), designa a instituição de normas ou regras referentes ao funcionamento de certas coisas e à execução de atos. E a disposição de forma para que se apliquem ou se cumpram medidas ou regras legais.[2]
          No Brasil, somente o Congresso Nacional tem poderes para regulamentar uma nova profissão, por meio de criação, votação, aprovação e sanção presidencial.

3 PRECEITOS CONSTITUCIONAIS

          No Brasil, seu exercício se dá de acordo com o preceituado na Constituição Federal, arts 5.º, incisos II e XIII, e 153, § 23, que dispõe:

          “É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer”.

          Sobre a legalidade da prática profissional psicanalítica, acrescentam-se ainda o Aviso Ministerial n° 257, de 6 de junho de 1957; o Parecer do Conselho Federal de Medicina, Processo Consulta n° 4.048/97, de 11/2/98; o Parecer n° 309/88, da Coordenadoria de Identificação Profissional do Ministério do Trabalho; o Parecer n° 159/2000, do Ministério Público Federal e da Procuradoria da República, do Distrito Federal; e Portaria n° 1.334, de 21 de dezembro de 1994.

4 PARECER N° 02/98, DO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, PROCESSO CONSULTA N° 4.048/97 DE 11/2/98

          Manifestou o Conselho Federal de Medicina, em 11 de fevereiro de 1998, que a atividade psicanalista é independente de cursos regulares e acadêmicos, sendo os profissionais formados pelas sociedades psicanalistas e analistas didatas. Apesar de manter interfaces com várias profissões pela utilização de conhecimentos científicos e filosóficos comuns a diversas áreas do conhecimento, não se limita a especialidades de nenhuma delas, constituindo-se uma atividade autônoma e independente.

5 PARECER DO PROCURADOR DA REPÚBLICA N° 159/2000

          Esse parecer foi dado no dia 24 de agosto de 2000, pelo Procurador Luiz Fernando B. Viana, nos autos da Ação Ordinária n° 1998 34.00.025253-4, interposta pela Sociedade Psicanalítica Ortodoxa do Brasil, com pedido de tutela antecipada.
          O pedido originou-se em decorrência de representação feita pela Sociedade Brasileira de Psicanalistas (ABP), visando obstar a manutenção dos cursos e seminários que a autora promove.

6 AVISO MINISTERIAL N° 257, DE 6 DE JUNHO DE 1957

        1. É lícito a centros de estudos, bem como a qualquer instituto ou centro igualmente credenciado pela Associação Psicanalítica Internacional, contratar os serviços especializados de psicanalistas leigos, cuja formação psicanalítica tenha sido reconhecida pela Associação.

      2. Esses psicanalistas leigos poderão exercer suas especialidade em todas as suas aplicações, dentro ou fora dos institutos que os contratem, desde que os clientes de que se ocupam lhes sejam enviados por indicação escrita de médico diplomado, que terá responsabilidade sobre eles.

          3. Estas normas comunicadas para os devidos fins ao Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina regularão o assunto até que lei especial estatua a respeito.

          Como profissional do direito, cumpre-me aqui asseverar que essa matéria não era de competência do Senhor Ministro, tendo em vista que, segundo nosso ordenamento jurídico, somente lei federal pode estatuir regulamentação profissional. O Aviso n° 257/57 não pode ser olvidado como um importante marco inicial para o reconhecimento da psicanálise em nosso país pelo Poder Executivo.
          Ademais esse Aviso condicionou o exercício da profissão à formação psicanalítica por meio de entidades reconhecidas pela Associação Psicanalítica Internacional. Entendemos que tal subordinação do exercício profissional de brasileiros a uma entidade alienígena é um ato contrário à soberania nacional e, portanto, inconstitucional e ineficaz tal exigência.

7 CLASSIFICAÇÃO BRASILEIRA DE OCUPAÇÕES (CBO)

          O Código da Atividade do Psicanalista, na Classificação Brasileira de Ocupações, instituídas pelo Ministério do Trabalho, conforme a Portaria n° 1.334, de 21 de dezembro de 1994, é o CBO: 0-79.90.

8 PROJETOS DE LEI

          8.1 Projeto de Lei n° 57 de 1975, de autoria do Sr. Francisco Amaral

          8.2 Projeto de Lei n° 729 de 1975, de autoria do Sr. Célio Marques

      8.3 O Projeto de Lei do Senado n° 248, de 1977, de autoria do Senador Sr. Nelson Carneiro

          8.4 O Projeto de Lei n° 4.603 de 1977, de autoria do Sr. Otavio Ceccato

          8.5 O Projeto de Lei n° 2.227, de 1979, de autoria do Sr. Pacheco Chaves

          8.6 O Projeto de Lei n° 2.510, de 1979, de autoria do Sr. Simão Sessim

          8.7 O Projeto de Lei n° 3.944, de 2000, de autoria do Sr. Eber Silva

          8.8 O Projeto de Lei n° 2.347, de 2003, de autoria do Sr. Simão Sessin°

          Notas:

          1. Cf. SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico, v. 4. p. 78.
          2. Cf. SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico, v. 4, p. 78.

CONCLUSÃO

          Depois de longa análise com base nos princípios gerais do direito; nos ensinamentos da psiquiatria, da psicologia e da psicanálise; na análise da legislação vigente, consubstanciada na Constituição Federal e no Aviso Ministerial de n° 257, de 6 de junho de 1957; nos vários Projetos de Lei apresentados ao Congresso desde 1975; nos Pareceres do Procurador da República e do Conselho Federal de Medicina; bem como nos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais que orientam e regulamentam a matéria – respondemos a questionamentos feitos quando de nossa proposta de pesquisa e chegamos ao seguinte entendimento:

          1. O direito constitucional, indiscutivelmente, possui poder predominante sobre os demais ramos do direito, tendo em vista que toda legislação ordinária terá que seguir seus princípios, ou seja, conhecer o direito constitucional é, antes de tudo, conhecer os preceitos contidos na Constituição Federal, lei máxima de um país, que reflete diretamente na vida do cidadão, determinando seus deveres, direitos e garantias.

           2. Direito significa, etimologicamente, o que é reto, o que não se desvia, seguindo uma só direção. É tudo aquilo que é conforme a razão, a justiça e a eqüidade. É o complexo orgânico do qual derivam todas as normas e obrigações, para serem cumpridas pelas pessoas, compondo um conjunto de deveres, dos quais não podem fugir, sem que sintam a ação coercitiva da força social organizada. Ressalte-se que todo poder emana do povo e em seu nome é exercido e ninguém pode deixar de cumprir a lei, alegando desconhecê-la, e, sobretudo, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

          3. A psicanálise, na sua concepção mais simples, é a ciência do inconsciente, criada no final do século XIX por Sigmund Freud, e fundamenta-se em um método de investigação que consiste essencialmente em evidenciar o significado inconsciente das palavras, das ações e das produções imaginárias.

          4. Quanto à influência da doença mental na prática de crimes ou na desobediência às normas, tivemos a oportunidade de examinar algumas patologias e confirmar que a presença delas leva a pessoa agir de forma diferente da que agiria em plena saúde.

          5. A psicanálise está intrinsecamente ligada ao direito, e ambos têm como fim o bem-estar do indivíduo. Ambos utilizam a palavra: o direito, de forma preventiva e coercitiva para dirimir conflitos; e a psicanálise, mediante a compreensão do indivíduo e de seus traumas pela livre associação das ideais.

           6. O psicólogo, o psiquiatra e o psicanalista, de forma distinta, procuram promover o bem do indivíduo.

           O psicólogo é o especialista em psicologia que aplica no seu trabalho as atividades de observação do comportamento humano em seus aspectos objetivos, observáveis, que possam ser medidos, compreendidos, controlados e descritos objetivamente. O psicólogo se ocupa, prioritariamente, da mente consciente do indivíduo.

         O psiquiatra é o médico com especialização em medicina, cujo conteúdo abrange a ciência das doenças psíquicas, neuroses, psicoses e respectivos distúrbios mentais, bem como o tratamento a ser aplicado, inclusive com o uso de medicação.

            O psicanalista é o profissional que aplica os princípios, os postulados, as técnicas e os métodos da psicanálise no tratamento ou na prevenção de distúrbios psíquicos de natureza inconsciente.

          7. Legitimidade para o exercício da psicanálise. A psicanálise não é regulamentada como profissão no Brasil e em nenhum outro país do mundo. Entre os psicanalistas e as diversas associações que os formam no Brasil e no mundo, existem muitas controvérsias e discussões fundamentadas no processo de formação e na natureza do exercício da prática terapêutica e sobre as possibilidades de sua regulamentação.

          No Brasil, na falta de uma lei que regulamente o exercício da profissão, esta é suprida com o preceituado na Constituição Federal arts. 5.º, incisos II e XIII, e 153, § 23.

          Prevalece hoje, no Brasil, a legitimidade do exercício àquele que possui curso superior, participou de curso de formação específica, ministrado por uma associação de psicanalistas e trabalha de acordo com os princípios morais e éticos que devem nortear a conduta de todo homem e profissional serio.

REFERÊNCIAS

ALTAVILA, Jaime de. Origem dos direitos dos povos. 6. ed. São Paulo: Ícone, 1995.

BOBBIO, Norberto. Liberalismo y democracia. Tradução para o espanhol de José F. Fernández Santillán. México: Fondo de Cultura Económica, 1996.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Luiz Eduardo Alves de Siqueira. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

CAMPOS, Humberto. Diário secreto. Rio de Janeiro: O Cruzeiro, 1954, v. 1.

COSTA, Sérgio Fernandes da. Teoria psicanalítica I. material didático para a disciplina psicanálise. Nova Iguaçu: Esflup, 2004. 21 p. Apostila xerografada

DANTAS, San Tiago. Programa de direito civil. 4ª tir. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1979. v. 1.

DOUCET, Friedrich W. A psicanálise: exposição comparada dos textos de Freud, Adler e Jung. Tradução para o português de Maria Emilia Ferros Moura. Lisboa: Editores Associados. [s.d.].

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio eletrônico. Direção de Carlos Augusto Lacerda. São Paulo: Nova Fronteira, 1999. 1 CD-Rom. Produzido por MGB Informática Ltda.

FIQUEIREDO, Jorge Barros. Psiquiatria I. material didático para a disciplina psiquiatria. Nova Iguaçu: Esflup, 2004. p. 2. 28 p. Apostila xerografada.

FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 7. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2002.

FREUD, Sigmund. Introduction a la psychanalyse. Traduction de l’Allemand avec l’autorisation de l’ auteur par le docteur S. Jankélévitch. Paris: Payot, 1924.

GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978.

HOUZEL, Suzana Herculano. O cérebro nosso de cada dia: descobertas da neurociências sobre a vida cotidiana. 1. ed. 6ª reimp. Rio de Janeiro: Vieira & Lent, 2004.

JACQUES, Paulino. Curso de direito constitucional. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987.

KORZENIAK, Jose. Dercho constitucional I: generalidades. Montivideo: Fundacion de Cultura Universitária, 1978.

LAGACHE, Daniel. A psicanálise. 2. ed. Tradução de Nelson Leon° São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1961.

LISBOA, Roberto Senise. Manual elementar de direito civil: teoria geral do direito civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. v. 1.

LOPES, José Reinaldo de Lima. O direito na história: lições introdutórias. São Paulo; Max Limonad. 2000.

MIRA Y LOPES, Emílio. Manual de psicoterapia. Tradução de José Alves Garcia. Rio de Janeiro: Editora Scientifica, 1942.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: parte geral. Atualizado por Ana Cristina de Barros Monteiro França Pinto. 39. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

MORAIS, Evaristo de. Criminalidade passional: o homicídio e o homicídio-suicidio por amor. São Paulo: Livraria Acadêmica, 1933.

NOYES, Arthur P. Psiquiatria clinica moderna. Traducción del doctor Leopoldo Chagoya Beltrán. 4. ed. México: La Prensa Médica Mexicana, 1971.

OLIVEIRA, Ramom Tácio de. Manual de direito constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de família: uma abordagem psicanalítica. Belo Horizonte: Del Rey, 1997.

PIÉRON, Henry. Dicionário de psicologia. Tradução para o português de Dora de Barros Rio de Janeiro: Globo, 1987.
 

CRÉDITOS
 

*Arnaldo de Souza Ribeiro é Advogado, Conferencista, Mestre em Direito Privado pela UNIFRAN. Vice-coordenador e Professor de Direito

Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Itaúna.

Professor convidado da ESFLUP - Escola Fluminense

de Psicanálise Clínica. RJ.
 

E-mail: souzaribeiro@nwnet.com.br

Arnaldo de Souza Ribeiro

Publicado no Recanto das Letras em 26/10/2009
Código do texto: T1887745


Conselho Brasileiro de Psicanálise (I.N.N.G.) é licenciado sob uma Licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivs 3.0 Unported. Based on a

work at https://www.cobrpsi.org Permissions beyond the scope of this

license may be available at https://www.cobrpsi.org @import

url(https://www.google.com/cse/api/branding.css);

cobrpsi@cobrpsi.com

https://www.cobrpsi.com

https://www.cobrpsi.org

  • LinkedIn ícone social
  • Twitter
  • YouTube
  • Pinterest
  • Instagram
bottom of page